Microsoft demite apresentadora por causa de assédio

Isadora Basile, que apresentava o canal XboxBR no YouTube, foi demitida por causa do comportamento do seu público no dia 16 de outubro de 2020. Ela revelou ter recebido ameaças de morte e de estupro desde que foi anunciada no cargo. No lugar da Microsoft dizer para os seus consumidores que esse tipo de comportamento não é saudável, a empresa simplesmente decidiu demitir a apresentadora.

No início de setembro, quando anunciei meu novo trabalho, sofri ataques de todos os tipos, desde pessoas falando que eu não jogava jogo x ou y e por isso não era ‘digna’ do meu cargo, até ameaças de estupro, morte e julgamentos por expor situações mais tensas […] Devido a todos esses ataques, a Microsoft encontrou como melhor opção me desligar do cargo de apresentadora para que eu não esteja mais exposta a situações como essas que se passaram”, Isadora Basile.

Para justificar a demissão de apresentadora o perfil do Xbox Brasil no Twitter revelou que fizeram mudanças de estratégia no Brasil, resultando em menos canais. “Agradecemos a Isadora Basile e a talentosa equipe da agência por sua criatividade e contribuição ao Xbox News. O canal Xbox BR continuará experimentando novas maneiras de entreter os gamers brasileiros”.

O motivo que a empresa deu para a saída de Basile pareceu mais uma desculpa para fugir do assédio. A Microsoft não conseguiu lidar com a situação e resolveu apenas cortar quem não era o problema, em vez de tentar corrigir o comportamento de seus seguidores e usar essa questão para falar sobre as mulheres no universo dos games.

Um estudo realizado pela ONG Plan International em 22 países aponta que, em média, 58% das mulheres jogadoras sofrem algum tipo de assédio virtual. No Brasil, 77% das mulheres já foram assediadas, demonstrando que Basile não é a única a sofrer esse tipo de ataque. Ela disse que sempre foi comum receber esse tipo de ofensas e teve que aprender a lidar com isso. “Graças ao apoio da minha família, namorado e amigos, aprendi a lidar bem com isso”.

Essa reação da apresentadora demonstra que as mulheres aprendem a lidar com os abusos, porque eles não param. Existe uma cultura que normatiza o assédio, sobretudo quando não ocorre a punição dos assediadores, como o caso de Marina Ferrer. Além das marcas da violência, as mulheres sofrem com a falta de punição para esses homens e também com a humilhação de ser desacreditada, ou, no caso da empresa de games, demitida.

De acordo com uma pesquisa realizada pela Game Brasil em 2019, 53,6% dos gamers brasileiros são mulheres. Esses números pioram o fato das mulheres serem assediadas no meio. Além disso, a imagem principal das personagens femininas nos games é a da sexualização, além de pessoas indefesas desesperadas por ajuda. Os corpos sensuais representados não deveriam ser o padrão para uma guerreira, mas essa sexualização, enfatizada com roupas curtas, existe para agradar o público masculino. Quando uma personagem tem o corpo mais real, o jogo sofre críticas, como Abby, de The Last of Us 2, que foi criticada por causa dos seus músculos.

No caso da Microsoft, a solução não foi defender a sua apresentadora e sim demiti-la, por causa de um comportamento que não partiu dela, ainda mais sendo a vítima de ataques, e não quem os propagou. A situação de Basile demonstrou que até as jogadoras passam por situações ofensivas, mesmo sendo a maioria entre os gamers. Os jogadores homens muitas vezes não aceitam que as mulheres jogam melhor e, por isso, tentam desestimulá-las através do assédio.

A história feminina nos jogos é marcada pela sexualização e, quando conseguem fugir desse estigma, as jogadoras sofrem abusos e as personagens são criticadas. É lastimável perceber que, em vez de ser acolhida pela empresa, Isadora Basile foi demitida. Ela foi punida, enquanto seus assediadores foram recompensados com sua saída.

 

Vanessa Forte é jornalista, bolsista DTI do CNPq e membro do MíDI na Universidade Federal de Rondônia (UNIR).


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