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MEC rebaixa ensino superior ao perseguir instituições e exigir EaD

A prioridade do Ministério da Educação deveria ser a melhoria da qualidade do ensino. Esta, entretanto, não parece a principal preocupação de Abraham Weintraub, focado na constante fiscalização e tentativa de interferir na autonomia das instituições federais de ensino superior do país. O sistema recém-lançado pelo MEC serve para o ministro vigiar e punir as universidades e os institutos federais que não seguirem suas decisões. A exigência mais recente é que as aulas retornem de qualquer forma; não importam as condições reais para isso ou o impacto no ensino-aprendizagem dos principais envolvidos. É a máxima do jogador de futebol Vampeta adaptada à educação, os professores fingem que ensinam e os estudantes fingem que aprendem, mas não por culpa deles.

Com a pandemia da COVID-19, aumenta a discussão sobre o ensino a distância; na verdade, ensino remoto, tendo em vista a urgência da situação, que é marcado pelo improviso. Um improviso que já tem afetado estudantes e professores, sem cultura digital (hábito), formação e treinamento para realizar ensino-aprendizagem a distância. A falta de equipamentos adequados também afeta os professores, na produção de materiais adaptados às linguagens e aos recursos hipertextuais e multimídias, e os estudantes, no consumo efetivo desses produtos. Da população brasileira, menos de 80% possuem acesso à internet, destes, menos da metade dispõe de computador com acesso fixo e regular; sem falar das muitas conexões que acontecem por dados limitados ou sem velocidade adequada para consumo de arquivos grandes. Em regiões brasileiras como a Norte, e nos interiores, os números tendem a ser mais graves e preocupantes.

A quarentena em virtude da pandemia tem gerado ainda dificuldades de manutenção da saúde psicológica, amplificadas em ambientes com instabilidades familiares. Nesse curto período, aumentou a violência doméstica no país, inclusive em Rondônia. Por causa de conhecimento, cultura, equipamento e ambiente, a casa não se apresenta para muitos como espaço para aprendizagem. A audiência, evidentemente, não será cativada, mas afastada, como já acontece em experimentos brasileiros, em ensino fundamental, médio e superior. Muitos pensam apenas na existência da tecnologia como solução, mas ela é somente o primeiro passo, não o último. O resultado da pressão pelo EaD dessa maneira parece evidente: um rebaixamento na qualidade da educação superior.

EaD não é o padrão, mas uma alternativa paliativa para diminuir a desigualdade educacional nas diversas regiões. A exceção não pode ser tratada como regra, e a coação do ministro faz parte de um projeto político que se coaduna com uma decisão ainda de dezembro de 2019. A Portaria nº 2.117 permite que os cursos superiores realizem até 40% de aulas na modalidade EaD. Os cursos presenciais podem ter agora, portanto, quase metade da sua carga horária promovida de forma remota. Por isso, a quem interessa retornar com a educação formal no improviso? Essa gambiarra, ou armengue, só deprecia a educação; em épocas de fake news, seria a promoção de um fake ensino-aprendizagem.

 

Allysson Martins é jornalista, professor e pesquisador do MíDI – Grupo de Pesquisa em Mídias Digitais e Internet da Universidade Federal de Rondônia (UNIR).

 

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