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PANDEMIA: dependência de benefícios sociais expõe fragilidade brasileira

O surgimento da COVID-19, além do colapso sanitário que causou no mundo, ressaltou a dependência financeira de brasileiros em relação aos benefícios sociais promovidos pelo governo. Em 2021, mais de 14,3 milhões estão desempregados no Brasil, o maior número desde 2012, quando o IBGE (Instituto Brasileiro Geográfico e Estatísticas) iniciou essas pesquisas. Os dados acionam mais de 2 milhões de brasileiros que perderam postos de empregos durante a pandemia, necessitando de benefícios de assistência social. Os auxílios governamentais, muitas vezes, são a única renda fixa dos cidadãos.

A pandemia não só demonstrou a desigualdade existente no país como também a fez piorar, segundo o economista Mário Almeida. O Brasil havia conseguido diminuir a desigualdade, inclusive regional, através das políticas públicas implementadas em apoio a microempreendedores e da criação de bolsas estudantis em incentivo ao ensino superior dos estudantes de baixa renda, como o ProUni (Programa Universidade para Todos) e o FIES (Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior). Ainda para o economista, foi a partir de 2017 que a situação ficou crítica novamente, registrando a marca de 14,1 milhões de pessoas desempregadas – números que diminuíram nos anos seguintes, mas elevaram novamente a partir de 2020.

O que você percebe é exatamente o fim dessas políticas públicas, não só de transferência de renda, mas também de mobilidade social. Então, na verdade, a pandemia acaba mostrando a face mais cruel dessa desigualdade, porque não se trata mais só de não acesso ao trabalho, ou de não acesso a algum serviço público, mas se trata de não acesso à vacina”, explica Almeida.

Antes mesmo da existência do Auxílio Emergencial, promovido durante a pandemia, os brasileiros já dependiam de assistência social, como o Bolsa Família e o BPC (Benefício de Prestação Continuada). Essas políticas foram adotadas para diminuir a desigualdade que assola o Brasil pela falta de incentivo e acesso à educação e à qualificação profissional nas periferias urbanas e regiões rurais. Mesmo o país estando em declínio no índice do desenvolvimento nos últimos anos, o nível de consumo das classes populares ainda era mantido – possibilitando uma movimentação da microeconomia. Esse poderio foi prejudicado com a pandemia de modo escalonar, pois perde quem deixa de receber o salário e quem venderia produtos e serviços para essas pessoas.

IMPACTOS COM O FIM DOS AUXÍLIOS

O Governo Federal renovou a PEC (Proposta de Emenda Constitucional) para os beneficiários do Auxílio Emergencial em 2021, mas com um repasse menor e por menos meses do que no ano anterior. A média de R$ 600 diminuiu para R$ 250 e se estima que 11 milhões de brasileiros foram suspensos do benefício. As declarações do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do presidente Jair Bolsonaro demonstram mais preocupação com o teto de gastos do que com a vida da população. O ministro defende que o governo não suportará por muito tempo as demandas do auxílio. O problema é que também não se sabe quando a pandemia acabará, especialmente com um ineficaz combate à doença.

Segundo a beneficiária Gabriela Vila Nova, que teve o auxílio como principal fonte de renda em 2020, foi possível manter a qualidade de alimentação e os cuidados ao seu filho durante este período. Com o fim do primeiro repasse do benefício, ela ficou completamente sem renda. “[Me senti] desamparada. Procuro emprego, mas com o atual cenário não tenho como arcar com as minhas despesas sem ajuda de terceiros”, relata.

O economista Mário Almeida acredita que o fim do auxílio afetará as atividades econômicas durante a pandemia, principalmente pela falta de movimentação no setor de microcomércio. “Em termos de economia política, o Governo tem a missão de atender a população mais pobre, e não deixar na mão do mercado. Porque o mercado quer saber do lucro, e o Estado, na teoria, ele busca o bem comum, especialmente dos mais necessitados”, afirma.

As pessoas que defendem o fim desses benefícios sociais estão convictas de que o lucro ganho com a contratação desse público oferecerá às empresas melhores condições de mercado. Com as pessoas mais necessitadas por uma renda, é mais fácil convencê-las a trabalharem em condições mais precárias. Esse tipo de pensamento demonstra a falta de compreensão do prejuízo que o fim dessas políticas pode gerar ainda mais na economia do país. “Quanto menos renda, menor será o consumo. E, com certeza, menor será a venda. Porque isso impacta também quem vende”, finaliza Almeida.

Essa realidade de desigualdade social é patente desde o início da formação do nosso país, quando povos de três continentes eram encarados de modo distinto. Quando a Lei Áurea aboliu a escravidão, por exemplo, não foram propostas políticas sociais que destinassem educação, trabalho e uma vida digna aos negros. Essa ação, além de não promover igualdade, segregou e elitizou as oportunidades de qualificação. E, mais de 100 anos depois, muitos desses problemas históricos foram amplificados durante a pandemia.

 

Quezia Dias é estudante de Jornalismo na Universidade da Amazônia (UNAMA) e colaboradora do MíDI.

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