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Projeto contra fake news em Rondônia contribui para desinformação e perseguição à imprensa

A Assembléia Legislativa do Estado de Rondônia (ALE-RO) possui três de Projetos de Lei (PL) para criminalizar a disseminação de fake news sobre doenças, em especial a pandemia da COVID-19. Os pedidos foram realizados pelos deputados Jair Montes, do Avante, José Clemente, vulgo Lebrão, do MDB, e Eyder Brasil, do PSL, respectivamente, em março, maio e julho de 2020. Enquanto o documento de Lebrão fala de “vírus Chinês” com “índices apocalípticos” e revela um desejo por cerceamento da imprensa, Montes defende a liberdade dos jornalistas, ainda que estes devam “ceder” em certos momentos, e Eyder enfatiza que os “prejuízos” das fake news podem ser “irreparáveis”. Os dois primeiros projetos preveem que o valor das multas sirva para apoiar o tratamento de epidemias em Rondônia.

O deputado Lebrão, recentemente filmado guardando dinheiro em saco de lixo, pela Operação Reciclagem da Polícia Federal, parece mais incomodado com o jornalismo profissional do que com a desinformação que circula nas redes sociais e em blogs e sites sem credibilidade. “Esses criminosos muitas vezes estão inseridos” na imprensa, que, diariamente, realiza “uma campanha de terror e amedrontamento junto a (sic) sociedade”. A PL 609/20 chega a propor cerceamento à imprensa, pois suas notícias “são veiculadas sem punição alguma”.

Jair Montes, por outro lado, afirma que a “preocupação não é com os profissionais de imprensa, mas com pessoas que, muitas vezes sob anonimato e com interesses escusos, divulgam informações sabidamente falsas, especialmente em meio digital”. A PL 498/20 diz ainda que os jornalistas “não poderão ser processados no livre exercício de sua atividade profissional”, embora aponte que a liberdade de imprensa precise “ceder” em casos de “abuso” – mesmo que não especifique de que tipo. Os projetos não apresentam referências ou consultas explícitas a cientistas, especialistas no assunto, ainda que o PL 710/20 (Eyder) cite o International Fact-Checking Network (IFCN) do Instituo Poynter, o Dia Internacional da Checagem de Fatos e as leis brasileiras que tratam dos crimes cibernéticos.

No geral, não são abordadas apenas as informações falsas – pois o jornalismo se retrata quando erra -, mas do que eles consideram, especialmente Lebrão, de “caráter duvidoso”. As imprecisões contidas nos projetos podem abrir espaço para perseguição até aos meios de comunicação de credibilidade. Em texto anterior, já abordamos como o jornalismo não produz fake news, embora seus profissionais possam se enganar e também propagá-las (false news).

É do ofício do jornalista fazer erratas e apresentar sempre a informação verdadeira, pois eles não trabalham com a mentira. A criminalização do jornalismo profissional se alinha à visão de outros políticos, como o presidente Jair Bolsonaro, em nível nacional, e o governador de Rondônia, Marcos Rocha, em âmbito estadual. E a descrença nesta instituição tem também contribuído com a propagação das fake news.

 

Allysson Martins é professor de Jornalismo e coordenador do MíDI na Universidade Federal de Rondônia (UNIR), nascido, criado e crescido no Nordeste, mas residente no Norte há meia década.

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MíDI - Laboratório de Mídias Digitais e Internet

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